domingo, 16 de abril de 2006

A ternura dos quase 60

Ainda vou nos 33! Anos percorridos com sobressaltos, alegrias, perdas intoleráveis, tristezas profundas, júbilos, desencantos e momentos de exultante euforia.
(Segundo os cânones, ainda desfrutarei, pelo menos, da outra metade do percurso e, talvez por isso o desígnio da morte só se sublima em mim através das perdas que irremediavelmente ainda virei a sofrer. É esse o mal de amar! Um sentimento que requer reciprocidade, mas que, na maioria das circunstâncias, é de um egoísmo exacerbado, quase parasitário das emoções da contraparte, cerceador da liberdade alheia e circunscritivo da sua conduta. Como uma imagem reverberada por um espelho, vemos os outros em função de nós próprios.)
Os parêntesis que delimitam o parágrafo anterior foram colocados à posteriori quando, num estado de lucidez – ler texto desassossegado em epígrafe neste blogue –, reparei que divagava a bom divagar.
Voltando ao assunto sobre o qual me apetece discorrer.
Dizem que com a idade, principalmente quando se dobra o difícil cabo dos 50, as pessoas ficam mais piegas, mais susceptíveis a estados de comoção, até mais compreensivas e dóceis, com uma certa dose de loucura reminiscente (percebida) e remanescente da juventude (inconsciente).
Ao 10.º romance, damos por nós a lembrar que Auster já não é uma criança, o jovem escritor da Trilogia ou do Palácio da Lua. Falta menos de um ano para Paul completar os seus sessenta anos, precisamente a idade do seu protagonista-narrador, Nathan Glass, incluído no seu último romance «As Loucuras de Brooklyn».
Auster não está melhor, nem pior, está diferente!
Não está diferente na forma de abordar o acaso – eternamente presente na sua obra – e as consequências implacáveis dos pequenos grandes episódios que preenchem a nossa vida. Não está diferente na inclusão do aparentemente insignificante que tudo significa na narrativa. Contudo, está menos sério na substância – e entenda-se aqui por “menos sério” como qualificativo do grau de comicidade –, mais solto e mais arejado, não tão carregado, embora “a miséria humana” permaneça o seu tema central.
Provavelmente, este é o menos austeriano dos seus romances. Não exige o mesmo grau de introspecção que romances como «Palácio da Lua», «Timbuktu», «Leviathan» ou até «O Livro das Ilusões» exigem. Não é tão hermético e negro como «A Trilogia de Nova Iorque»; nem tão violento, exasperante e trucidante como «A Música do Acaso».
«As Loucuras de Brooklyn» é o seu primeiro romance a mencionar acontecimentos que afectaram de forma marcante os Estados Unidos e que deixaram feridas ainda muito longe de cicatrizar na sociedade americana: as eleições presidenciais de Novembro de 2000 e o famoso imbróglio judicial no Estado da Florida, e os atentados de 11 de Setembro 2001.
Avaliação final: omitida por falta de imparcialidade!
Em jeito de nota final – para mais não roubar ao prazer da sua descoberta –, deixo aqui ficar uma classificação muito pessoal, por ordem de preferência e de entusiasmo literário, de 8 dos 10 romances já publicados por Auster até à data:

  1. A Trilogia de Nova Iorque – (The New York Trilogy, 1985);
  2. A Música do Acaso – (The Music of Chance, 1990);
  3. Palácio da Lua – (Moon Palace, 1989);
  4. Leviathan – (Leviathan, 1992);
  5. Timbuktu – (Timbuktu, 1999);
  6. O Livro das Ilusões – (The Book of Illusions, 2002);
  7. As Loucuras de Brooklyn – (Brooklyn Follies, 2006);
  8. A Noite do Oráculo – (Oracle Night, 2003).

Notas:
(1) Infelizmente, ainda não li, e já conhecem os meus critérios – linguísticos – os romances «In the Country of Last Things» (1987) e «Mr. Vertigo» (1994).
(2) Obviamente, foram excluídos da lista os seus ensaios, poesia e argumentos para filmes – igualmente deleitáveis.

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