domingo, 9 de julho de 2006

Impunidade

Charles BukowskiApesar de carregar somente 34 anos de fardo neste lombo tipicamente luso-varonil – sei lá como isso se define! –, já consegui entender que a torturante pescadinha de rabo na boca nacional passa sempre pelos domínios da justiça e da educação.
Dizem-me – e até sou gajo para acreditar, porque até vejo – que me engano ao eleger a justiça – de que a denegação não é a injustiça, mas antes a dócil impunidade – como o pilar de base que sustenta e norteia esta sociedade lusitana, cuja idiossincrasia social traduz-se bem pelo recurso ao vocábulo mediocridade – como, aliás, não me canso de referir.
Ora, este argumento baseia-se no seguinte pressuposto: se as políticas estruturais privilegiassem a educação, no sentido amplo do termo, como campo primordial de intervenção e de actuação duradoura – englobando todos os actores com responsabilidades na matéria, da família ao Estado –, a justiça por si só funcionaria.
Eu respondo sempre com a história do ovo de Colombo, das pescadinhas, da justiça como incentivo à educação na medida em que, a primeira enquanto redutora de desequilíbrios, permitiria que o sistema de desenvolvimento da sociedade em questão se encontrasse devidamente afinado, servindo de base à promoção e ao aperfeiçoamento da segunda.

Ponto de ordem: Discussões metafísicas à parte – que rapidamente poderiam resvalar para o fecundo campo da patafísica –, imagine-se que uma frase do lúbrico e coloquial Charles Bukowski pode desenredar, com num passe de mágica, esta aparente perplexidade:

O narrador queixa-se que determinada pessoa que empregara a si e a outro sujeito tinha-os «…fodido bem fodidos, de todas as maneiras possíveis e imagináveis.» Mas que não podiam «berrar pela lei, porque quando um gajo não tem dinheiro a lei deixa de funcionar.»
Em A Sul de nenhum Norte: Histórias da Vida Subterrânea, de Charles Bukowski, Relógio D’Água, 1.ª edição, Outubro de 1997, pág. 75. [Tradução de Manuel Resende] (South of no North, 1973).

Ora, este pequeno e contundente naco de prosa foi escrito nos Estados Unidos no início da década de 70 do século passado…

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