quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Crónica de um portista arrebatado

O desafio foi sugerido pelo Ricardo, um companheiro de paixão clubística que, acudido por uma indelével memória onírica, convidou a blogosfera que se revê no azul e branco draconiano a postar as rememorações de um passado recente de alegrias e vitórias.

Uma paixão não se explica, não se arrazoa, nem pode ser entendida por quem dela não partilha o arroubamento, a entrega e um desvairado sentimento de protecção da coisa amada. É um amor exacerbado que os compêndios do comportamento humano não conseguem explicar que não seja por meras suposições e preconceitos subtractivos da razão do sujeito que ama sem condições, hipóteses ou regras de conduta.
Os apoucadores da paixão alheia soem relacioná-la com um estado de violência latente que se poderá materializar num ensandecimento lesivo da sã convivência. Embora não haja paixão sem impetuosidade – o tal ardor que nos consome as entranhas –, a sua exteriorização jamais se poderá confundir com violência; essa é um subproduto dos que supostamente amam, porque um verdadeiro apaixonado não utiliza o sujeito ou o objecto da sua paixão em serviço de outros desígnios que não sejam o alimento da própria alma.

Em Abril de 1984, tinha eu 11 anos, o FC Porto defronta o então temível Aberdeen FC de Alex McLeish e de Gordon Strachan, treinado por Sir Alex Ferguson. Disputar-se-ia a meia-final da extinta Taça dos Vencedores das Taças. Na 1.ª mão o meu Porto, num jogo inesquecível do extremo esquerdo Costa (José Alberto), ganhou por 1-0 com um golo do bi-bota Fernando Gomes aos 14 minutos de jogo. Lembro-me bem da sensação que dominava os portistas após o interminável abandono do estádio naquela quarta-feira fria de Primavera: a exibição foi portentosa, o resultado foi escasso e temíamos o poderio do adversário no jogo seguinte que se iria disputar na paisagem sombria de terras da Escócia.
Aberdeen, Escócia, Abril de 1984. Noite cerrada de nevoeiro. Um estádio repleto de fervorosos adeptos escoceses assiste à esmagadora superioridade defensiva do FC Porto – recorde-se que nessa época o Porto foi campeão nacional, tendo a defesa constituída por João Pinto, Inácio, Eurico e Lima Pereira apenas permitido o marcação de 6 golos pelas equipas adversárias – e um temível contra-ataque liderado por Gomes, Costa e pelo recém-entrado Vermelhinho. A exibição de Costa na 1.ª mão permitiu levar consigo para o flanco direito – flanco que viria a ocupar com a substituição – 3 jogadores do Aberdeen. Após um ataque da equipa escocesa alguém passa a bola a Vermelhinho que, havendo apenas corrido alguns metros, remata do meio campo para um monumental “chapéu” ao guarda-redes escocês. Estavam decorridos 76 minutos de jogo, o meu FCP acabara de se qualificar para a final de Basileia, onde veio a perder o troféu para a poderosa Juventus – que eliminara nas meias-finais o Manchester United – após os tristes acontecimentos com uma arbitragem de um senhor de nome Adolf Prokop, oriundo da ex-RDA, que de negligente nada teve…

Aqui fica o relato do golo de Vermelhinho pelo saudoso Gomes Amaro – não há portista da minha geração em diante que não se lembre dele – no Quadrante Norte (o som global!) com João Veríssimo, da noite recordo ainda um estádio inteiro, desportivamente, a aplaudir de pé a conquista do meu FC Porto:

Ficheiro wave (gravação arrancada a uma velhinha cassete Sonovox que repousava no pó da minha arrecadação)

4 comentários:

Anónimo disse...

Caro André,

Fantástico texto terminando com uma belíssima homenagem ao Gomes Amaro.
Esse golo... inesquecível. Foi a nossa primeira grande vitória internacional perante uma equipa que, na altura, era tida como a melhor equipa britânica. A primeira de uma série notável.
Obrigado pela memória. Bendito pó que guardou no seu ventre tamanha pérola. Ainda faremos juntos (com o resto da malta que incontornavelmente também desagua no Amaro) um museu a um ícone ímpar da nossa infância.
Abraço,
J. Ricardo

Anónimo disse...

meta outra vez o relato, por favor...

Anónimo disse...

Peço por favor que voltem a meter o relato do golo, sou primo do vermelhinho e gostava de lhe oferecer essa gravação... Um abraço Portista.

Anónimo disse...

O link do ficheiro audio da' erro.
Sera' que podiam disponibilizar o ficheiro novamente?
Antecipadamente agradecido.