sábado, 27 de outubro de 2007

Cento e sessenta e um

Desafia-me o Sérgio a entrar nas linhas (do acaso) com que os livros se cosem. (E, acredita, procurei seguir, em estrita observância, os caminhos do repto lançado.)

O desafio exige o cumprimento dos seguintes cinco passos:

  1. Pegue no livro mais próximo, com mais de 161 páginas – implica aleatoriedade, não tente escolher o livro;
  2. Abra o livro na página 161;
  3. Na referida página procurar a 5.ª frase completa;
  4. Transcreva na íntegra para o seu blogue a frase encontrada;
  5. Aumentar, de forma exponencial, a improdutividade, fazendo passar o desafio a mais 5 bloggers à escolha.

A minha experiência
O acaso lembrou-me Auster, mas a sua escolha levantou-me dois tipos de problemas. O primeiro resulta da própria significação da palavra que representa a acção, “escolha”, implica que houve um critério na selecção, infringe-se uma das regras basilares do exercício, a aleatoriedade. O segundo resulta da impossibilidade de encontrar a página 161 no livro de Auster que me está fisicamente mais próximo, Viagens no Scriptorium, já que dispõe apenas de 115 páginas.
Depois, pensei em agarrar-me ao Pêndulo… – salvo qualquer pulsão onanista – pela cabalística aí vertida, mas interpretar os 10 Sephiroth (ou emanações divinas) e os 32 caminhos da sabedoria… encontrava-me em Hesed (ou Chesed), a 4.ª Sephirah, Misericórdia, onde Eco chamou “Contando um dia em que tinha conhecido Pôncio Pilatos”. Mas, pareceu-me certo, comprometia a espontaneidade da coisa. Fui lavar as mãos…
De mãos e alma limpas, por afastamento de pensamentos impuros e cumprimento honesto do desafio que me foi lançado, peguei no livro que, de facto, repousava na minha secretária; tratava-se do último romance de Julian Barnes, Arthur & George. Acabei de o ler há cerca de duas semanas, mas a vontade de sobre ele falar no blogue, impediu-me de o colocar na estante dos livros subjugados ao meu autoritário olhar literário – alguma falta de paciência para escrever, tem-me levado ao adiamento da publicação do texto quase concluído.
Assim, seria materialmente impossível negar o seu mais ínfimo vislumbre, a não ser que, munido de um zelo autopunitivo, intentasse obnubilar as vistas… Um arrepio, fez-me ver a luz que reverberava do dito num tom ocre, pardacento.
Eis a 5.ª frase da página 161 do romance Arthur & George (Asa, 1.ª ed., 2007) do escritor inglês Julian Barnes:
«Estão a jogar com um pau de dois bicos.»

Nada acrescentarei à citação, à laia de enquadramento da dita no conjunto da obra, o antes e o depois – sobre o livro falarei quando me apetecer reabilitar o ficheiro de Word guardado no arquivo há duas semanas. No entanto, nada me impede que a utilize fora do contexto, aplicando-a ao exercício em cadeia em causa. Ainda me recordo dos efeitos colaterais dos “10 livros que não mudaram a vida”, somatizados numa rouquidão persistente de alguns puristas devido à imensa assuada ortodoxa motivada pelos mesmos, os presumidos donos da Literatura, mal disfarçando, contudo, o ressentimento do não-encadeamento.
Para concluir, aqui lanço o pau (afiado) de dois bicos, a cinco invulneráveis, resistentes, e estóicos amigos na blogosfera:

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