sábado, 8 de março de 2008

Listomania


É verdade, sou um listómano. Confesso, sem sombra de vergonha – afinal, trata-se de uma das facetas da minha indestrutível natureza pubertária –, a minha mania obsessivo-compulsiva de ordenar, classificar, qualificar os meus gostos, prazeres, encantamentos, ódios de estimação em listas, na maioria das vezes hierarquizadas.
Há pouco, enquanto deambulava pela rede, descobri a lista dos livros preferidos do escritor britânico (nascido acidentalmente em Paris, pelas funções de embaixador exercidas pelo pai) William Somerset Maugham (1874-1965). Não é que o autor faça ressoar as minhas campainhas da beleza e do espanto literários, aliás suponho que dos seus livros apenas um passou pelos meus olhos de ávido leitor – e foi o suficiente, por enquanto –, mas, curiosamente, quando num destes dias discutia literatura e gostos literários com a minha, outrora bibliófila, mãe, ela confessava-me que não só admirava os livros de Maugham – já na fase pós Condessa de Ségur (Sophie Feodorovna Rostopchine) –, havendo-os lido todos, como também os de outro escritor que, sinceramente, para mim e para o ponderado mundo literário contemporâneo, é-me completamente indiferente, falo do outrora popularíssimo autor norte-americano Irving Wallace (1916-1990), ele próprio um listómano, vejam-se os três volumes, publicados, respectivamente, em 1977, 1980 e 1983, do The Book of Lists.
Suponho que foi Jorge Silva Melo que, em conversa com Paula Moura Pinheiro, referiu a interessante mutabilidade dos gostos literários em Portugal – afirmando, no entanto, que o fenómeno não é exclusivamente nacional. Se atentarmos nos nomes de autores estrangeiros que encabeçavam as listas de vendas das livrarias portuguesas nas décadas de 60 e 70 do século passado, notamos que, apesar de se manter a avidez pela leitura dos denominados clássicos, alguns desses nomes e as suas obras foram relegados para segundo plano, substituídos por outros que lhes foram contemporâneos ou até mais antigos. À excepção de uns poucos, como Tolstói, Dostoievski, Hemingway, Steinbeck, Austen, as manas Brontë ou Kafka, hoje dificilmente conseguimos encontrar um numeroso conjunto de leitores de Graham Greene, Thomas Mann, Máximo Gorki, Chesterton, Jack London, John dos Passos, Leon Uris, Yourcenar, Morris West e até Doris Lessing, cuja literatura foi, todavia, recentemente ressuscitada pela atribuição do Nobel.
Não sei se os antigamente populares Irving Wallace, Morris West, ou mesmo Maugham, foram substituídos por autores cuja qualidade literária os consegue sobrelevar – também não os leio. Mas já não aguento entrar numa livraria nacional e ser acometido de uma cegueira súbita e, felizmente, transitória, pela iridescência de um mau gosto atroz dos frontispícios dos Sparks, Modignani, Nora Roberts, Allende, Paulo Coelho, Joanne Harris, Steel, já para nem falar dos livros de presuntivos escritores nacionais, que escondem, atrás do seu brilho, senão expulsando de todo para o pó dos armazéns, a literatura que gostaríamos não só de ler, como de dar a ler àqueles de quem gostamos. No Porto, pelo menos, não há nenhuma livraria que ponha cobro a este peste do popularucho e vendável.

Sem mais delongas, eis a tal lista de Somerset Maugham – cujas obras referenciadas, à excepção do estranhamente desaparecido dos escaparates lusos Henry Fielding, ainda hoje têm mercado:

  1. Tom Jones, de Henry Fielding (1749);
  2. Orgulho e Preconceito, de Jane Austen (Pride and Pejudice, 1813);
  3. O Vermelho e o Negro, de Stendhal (Le Rouge et le Noir, 1830);
  4. O Pai Goriot, de Honoré de Balzac (Le Père Goriot, 1835);
  5. David Copperfield, de Charles Dickens (1850);
  6. Madame Bovary, de Gustave Flaubert (1857);
  7. Moby Dick, de Herman Melville (Moby-Dick, 1851)
  8. O Monte dos Vendavais, de Emily Brontë (Wuthering Heights, 1847);
  9. Os Irmãos Karamazov, de Fiodor Dostoievski (Brat'ya Karamazovy, 1880);
  10. Guerra e Paz, de Lev Tolstói (Voyna i mir, 1865-1869).

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