quinta-feira, 31 de julho de 2008

Lesbiandades

Imagem de satélite: Ilha de Lesbos - Grécia
Como já referi, nos imensos textos que, para vosso fastio – porque se sentem impelidos a lê-los, mesmo que não vos apeteça –, venho publicando, há muito que abandonei a leitura exaustiva de um ou vários jornais nacionais generalistas, por diversas razões que não vêm agora ao caso. Vou-me mantendo actualizado como posso, sem dramas, numa criteriosa selecção dos temas que deverão multiplicar o volume normal das minhas sinapses.
Encontrava-me numa dessas leituras (neste caso atrasada, constava da pilha “a ler”), quando li que na Grécia a famosa ilha de Lesbos passou a ser um bico-de-obra – e nestas situações todo o cuidado com a língua é pouco – para as associações de gays e lésbicas.
Num processo movido por um conjunto de pessoas nascidas na dita ilha contra a OLKE, a organização representativa da comunidade gay e lésbica da Grécia, pretende-se banir do significado de lesbiano/a – no caso português é mais frequente utilizar-se o género feminino da palavra, apesar da existência do masculino com uma conotação diferente, privilegiando-se o critério da tolerância no campo da semântica – a afeição e o amor recíprocos entre mulheres, para passar a designar apenas os habitantes ou nativos da dita ilha.
A notícia é da Harper’s de Julho que traduziu a pretensão dos requerentes da acção judicial, agora traduzida por mim:

«Somos oriundos da ilha de Lesbos, onde nascemos e fomos educados, tal como os nossos progenitores directos e os nossos mais distantes antepassados, e temos orgulho da nossa herança. A nossa designação cultural [gentílico] apresenta-se como “Lesbiano/a”, tal como “Ateniense” se refere a indivíduos oriundos de Atenas. Assim, “Lesbiano/a” refere-se a cem mil habitantes da ilha e a outros duzentos e cinquenta mil cujas famílias provêm de Lesbos mas que residem noutro lugar. O termo Lesbiano/a é usado na língua grega desde tempos remotos. Encontramo-lo na Ilíada e na Odisseia; podemos, de igual modo, encontrá-lo no período bizantino e durante a ocupação otomana. Mas nas últimas décadas, o termo tem vindo a ser usado pela OLKE e por outras associações de mulheres com determinadas particularidades e excentricidades, embora os seus membros não disponham de alguma ligação com Lesbos. A sua justificação para esta designação arbitrária – que invoca a poetisa Safo, que nasceu na nossa ilha – não pode servir de álibi, já que está provado que Safo tinha meramente relações espirituais com as suas estudantes, e não as relações homossexuais que lhe foram atribuídas. Esta perversão pública cria-nos um problema de comunicação do nosso legado, forçando-nos a evitar o uso de palavras cujo significado foi mal compreendido. O uso deste termo por organizações de homossexuais constitui uma afronta à nossa dignidade, uma vez que a palavra lesbiano/a classifica um desvio da natureza. Nós exigimos que o uso da palavra lesbiano/a na denominação da OLKE seja proibido; que lesbiano seja removido de todos os títulos da organização e de qualquer tipo de contrato, jornal, periódico ou outro documento; e que os membros da organização sejam ameaçados com penas de prisão de um ano e de multa se se recusarem ao seu cumprimento.»
«Dare not speak our name», Harper’s, July 2008, p. 29 [tradução: AMC]
Sinceramente, não sei – talvez porque não leio jornais – se a ILGA internacional e a nacional já se manifestaram, na medida em que correm o sério risco de verem o seu feliz e colorido acrónimo transformado numa alternativa deveras mais penetrante, vibrante e arrepiante – portuguesmente falando, é claro – a ISGA (International Sapphic and Gay Association), já que, neste caso, os lésbicos ou lesbianos decerto não se importariam com as possíveis deturpações das práticas meramente espirituais da vetusta senhora que viveu entre os séculos VII e VI a.C. – não deixou descendência cujos laços se prolongassem por cerca de 2800 anos...

Mas se a moda pega, o que dirão então os habitantes de terras como Picha, Coina, os naturais da ambígua Lambedoiro (também dada a «desvios da natureza»), da incrivelmente masoquista Venda da Gaita e da potencialmente sádica Dafundo?

Já que por aqui enveredei, resvalando para a boçalidade, proponho já agora que se altere o nome da massa que se usa nos famosos e deliciosos pastéis de Chaves, para massa “Mil Folhas” à espanhola, porque a sua pronúncia soa aos nossos maiores compradores estrangeiros como “massa fodida” e é capaz de arruinar o negócio de qualquer um. E depois… depois, expliquem-lhes o que é uma “espanholada” e talvez estes se associem num ápice aos orgulhosos lesbianos num manifesto do género, embora mais globalizante e fálico.

P.S. – Tenham lá paciência e atentai na sua topografia… da ilha, claro. Como chamarão as lesbianas e os lesbianos (veia guterrista) àquelas duas baías? Por favor, consultar, por muito menos de 63 mil euros, os manos Beverly e Elliot Mantle, os maiores especialistas do mundo no assunto...

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