segunda-feira, 15 de março de 2010

Driving Mr. Penn

Se os tempos não tivessem mudado e no caso de coarctada a exposição mediática (para o bem e para o mal) de determinadas atrocidades perpetradas pela sordícia do autoritarismo legítima ou ilegitimamente referendado – exposição agora inexorável, facilitada pelo crescimento exponencial dos meios de difusão de informação não manipulada –, o actor norte-americano Sean Penn porventura – e trata-se de mera especulação, embora fundamentada pelos flagícios sociopolíticos do século XX – teria dado um outro final à sua frase, proferida – é bom notar – num ambiente irrestrito de liberdade de expressão, «Devia haver um tribunal que mandasse» fuzilar* «as pessoas […] por este tipo de mentiras», e aquele tipo consiste em alcunhar reiteradamente de «ditador» o déspota venezuelano Hugo Chávez, um «líder eleito» como afirmou Penn, servido-se de forma abusiva da proposição para servir de alavanca enfática à sua irritação impositiva. Mas, Hitler também foi eleito e aclamado pelo povo – o que, por curiosidade, até desfaz a retórica falaciosa professada num dos exaltados filmes messiânicos em que Penn foi figura de cartaz (e que lhe permitiu arrecadar meia dúzia dos mais importantes prémios do mundo do cinema e mais um punhado de dólares): E se Klara Hitler tivesse abortado durante a gravidez de Adolf?
É o mundo em mudança. Santana manda expulsar quem critique a direcção do partido. Penn mandaria prender quem apodasse Chávez de ditador. Não vale. Duas estrelas que se movimentam no caldo protector da democracia para poderem proferir este tipo de inanidades. Enviemo-los para a Venezuela, transformemo-los em venezuelanos retirando-lhes as actuais cidadanias. Nada melhor que vestir a pele daqueles que clamam e se expõem ao martírio pelo simples cheiro da liberdade.
Se ao primeiro lhe permito o dislate, porque não existe, de forma sentida, qualquer apelo a um resquício de indulgência, o sujeito é-me soberanamente indiferente, e tão-pouco afecta a minha vida; ao segundo, que me diz muito, até o perdoo porque me deu o inesquecível Lado Selvagem (Into the Wild, 2007), e protagonizou autoritariamente Mystic River ou Milk.
Nota: *verbo caro ao grande amigo do camarada Soderbergh.